Associação Socio-Profissional da Polícia Marítima recorda ex-chefe militar a dizer que "a lei não interessa"
A Associação Socio-Profissional da Polícia Marítima (ASPPM) disse esta quinta-feira aguardar uma "tomada de posição" dos vários candidatos presidenciais "sobre a perspetiva constitucional" de ter aquela força policial na tutela do ramo naval das Forças Armadas.
A posição da ASPPM foi assumida após o encontro de hoje com o candidato presidencial Paulo Morais, que considerou "muito estranho" estar a Polícia Marítima sob tutela da Marinha.
Recorde-se que a Polícia Marítima foi colocada na dependência da Autoridade Marítima Nacional, cargo que é ocupado pelo chefe do Estado-Maior da Marinha, almirante Macieira Fragoso - quando os militares estão constitucionalmente proibidos, em Portugal e nos países da UE e NATO, de exercer quaisquer competências em território nacional sem estar declarado o estado de sítio.
A ASPPM lembrou mesmo uma afirmação do almirante Melo Gomes, ex-chefe de Estado-Maior da Marinha e atual mandatário do candidato Sampaio da Nóvoa, feita em 2014: "A lei não interessa aqui. Vários presidentes da República e governos conviveram com ela nestes anos e não suscitaram dúvidas."
No comunicado à imprensa, intitulado "Candidatos presidenciais juram fidelidade à Constituição", a ASPPM recordou as queixas que dirigiu, nos últimos anos, aos diversos órgãos com competência constitucional para suscitar a fiscalização abstrata da constitucionalidade de haver uma força de segurança e órgão de polícia criminal na dependência de um chefe militar das Forças Armadas.
"Até ao momento, não se conhece qualquer iniciativa conducente a confirmar ou a afastar o fundamento das queixas", desde logo do Presidente da República, Cavaco Silva, e da Procuradoria-Geral da República - que, na sequência dos ataques terroristas do 11 de Setembro de 2001, declarou que as Forças Armadas não tinham autoridade para intervir (dirigir-se aos cidadãos, usar armas de fogo) em território nacional fora do estado de sítio.
Assim, as Forças Armadas só podem intervir no dia a dia em território nacional - e cumprir as missões previstas - na dependência das entidades civis e policiais com poder de autoridade para o efeito.
O candidato à Presidência da República dedica o dia às forças de segurança. Na agenda para a tarde estão marcados vários encontros com associações da PSP, GNR e guardas prisionais. Ainda esta manhã, Paulo de Morais reuniu com a Associação Profissional da polícia marítima. No final, criticou a falta de uma estrutura de salvamento na extensa costa portuguesa e assumiu um compromisso: se for eleito, irá avaliar a constitucionalidade da tutela da polícia marítima.
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Candidato presidencial estranha que Cavaco Silva tenha permitido tutela militar sobre agentes de polícia ( Diário de Notícias)
O candidato presidencial Paulo de Morais criticou hoje, no Porto, "a incongruência funcional" que decorre de a "Polícia Marítima, sendo uma força policial, estar na tutela de uma força militar armada" como é o ramo naval das Forças Armadas.
"Há aqui um problema de constitucionalidade [...] e assumo o compromisso de que, sendo eu Presidente da República, farei a verificação da constitucionalidade desta matéria porque no mínimo parece-me muito estranho que uma força policial esteja na tutela de uma força militar. E um Presidente da República que jura fazer cumprir a Constituição não pode permitir estas situações ambíguas", disse Paulo de Morais.
O candidato esteve reunido com a Associação Socio-Profissional da Política Marítima e, perante o facto de essas questões já terem sido colocadas ao Chefe do Estado, Cavaco Silva, registou que elas "não tiveram qualquer desenvolvimento". Daí Paulo de Morais ter deixado a garantia de que, consigo, tal "não acontecerá".
O problema mantém-se porque a Marinha, apesar de ser exclusivamente o ramo naval das Forças Armadas, continua a argumentar que lhe compete exercer a autoridade do Estado no mar, pelo facto de ter os navios e a experiência de os operar naquele ambiente.
Além de ser a lei - e não as capacidades - aprovada pelo poder político a determinar quem detém e pode exercer as competências de autoridade marítima, a própria Constituição estipula que as Forças Armadas não podem atuar em território nacional com poderes próprios, exceto se decretado o estado de sítio.
No dia a dia, e como a Procuradoria-Geral da República confirmou na sequência dos atentados terroristas do 11 de Setembro (2001), as Forças Armadas apenas podem intervir no território nacional - qualquer que seja o tipo de missão - sob a responsabilidade operacional de entidades civis e das forças e serviços de segurança.
A exemplo do que ocorre nos Estados de direito democrático da UE e da NATO, os militares das Forças Armadas não se podem dirigir aos cidadãos nem disparar as armas de fogo, pois carecem de autoridade legal para o efeito.
Contudo, os responsáveis da Marinha insistem em substituir-se às autoridades civis e policiais no mar com o argumento de que isso nunca foi declarado inconstitucional. Um dos principais defensores públicos dessa tesa tem sido o almirante Melo Gomes, que chefiou o ramo e é o mandatário do candidato presidencial Sampaio da Nóvoa - que se tem assumido como guardião da Constituição - para as questões da Segurança e Defesa.
Recorde-se que a atual lei orgânica da Marinha, aprovada pelo ex-ministro da Defesa José Pedro Aguiar-Branco, extinguiu todos os órgãos e estruturas da Autoridade Marítima Nacional existentes na orgânica do ramo militar.
Contudo, o governante manteve o chefe da Marinha no cargo civil de Autoridade Marítima Nacional e ainda atribuiu à Marinha a responsabilidade pelo salvamento marítimo.
Também por isto é que a Marinha assume responsabilidades em operações de resgate que a lei diz serem da competência exclusiva dos capitães dos portos, quando lhe compete apenas dar-lhes apoio quando solicitado.
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